in record.pt
RECORD - Começou a época na Naval 1.º de Maio mas agora está no Paços de Ferreira, curiosamente duas equipas neste momento com o mesmo número de pontos (10). Não está há muito tempo na capital do móvel mas já nos pode dar uma primeira impressão sobre esta nova experiência?
ULISSES MORAIS - Não teria assumido esta responsabilidade se não sentisse que ia sentir-me bem e que existiam condições para acreditarmos cada vez mais. Sinto que estou numa casa que tem muito a ver comigo. Estou consciente que nos dias que correm é algo que me parece raro. Acredito que as coisas vão continuar assim porque nada há em contrário em relação a um cenário diferente. Estou muito feliz por estar em Paços de Ferreira, onde me sinto em casa.
R - Já disse que o Paços de Ferreira é um clube à sua medida. Quer esmiuçar esta declaração?
UM - Quando estamos de fora, olhamos para o clube e percebemos que a casa pode não ter a melhor aparência. E nesse aspeto o Paços era um clube que já merecia melhor, ou seja, um estádio com outras condições. Por outro lado, quando defrontávamos o Paços o que sentíamos era que esta casa tinha alma. Porque para existir emoção e espetáculo há outras coisas essenciais que este Paços tem. Quando cheguei a esta casa, senti algo que tem a ver com a dimensão daquilo que eu entendo que é um clube com gente que vive o jogo e que tem gente que vive o seu clube com alma e paixão e que transmite isso a quem chega. O Paços é um dos clubes que ainda não perdeu a mística - provavelmente já não será a mesma de outros tempos - e que tem todas as condições para manter este espírito. E se alguma coisa se perdeu tem de se recuperar rapidamente, para que cada vez mais o Paços de Ferreira seja um clube com a identidade que é a sua imagem de marca..
R - Entende que as infraestruturas devem ser melhoradas?
UM - Todos os que trabalham naquela casa gostariam de ter, provavelmente, outro tipo de condições mesmo para poderem receber melhor não apenas os seus adeptos. Atualmente tudo se faz para que existam boas condições mas não é possível esticar mais.
R - Mas esse é um assunto falado no dia-a-dia?
UM - Desde a primeira hora registei a frontalidade com que me foi apresentado o projeto Paços de Ferreira, mostrando-me as virtudes, que são bastantes, e algumas das condicionantes, que também são algumas. Souberam dizer que gostariam de ter outro tipo de condições e que o clube está a crescer nesse sentido.
R - O que é que lhe foi pedido esta época?
UM - Os dirigentes tiveram o cuidado de nada me pedir e quando isto acontece é pedirem tudo. Tiveram a inteligência suficiente para me dizerem que o grande objetivo do Paços de Ferreira é permanecer neste patamar. Esse é o mínimo de ambição de qualquer equipa desta dimensão.
R - Mas lutar apenas pela permanência não será em vez de ambição falta dela?
UM - Na minha opinião é uma grande realidade. Agora, se a permanência for atingida com um patamar de menor sofrimento, parece-me que essa será uma ambição nivelada por cima. É isso que temos de perceber. Se queremos na próxima época estar neste escalão com sofrimento até à última jornada, ou com capacidade para que isso não aconteça. O Paços de Ferreira deseja, naturalmente, ver-se livre de qualquer situação incómoda, não deixando a equipa exposta no último terço do campeonato, quando tentam lutar por todos os meios e por todas as formas para se salvar. Essa é, naturalmente, uma situação que me parece muito normal e que nada tem a ver com a falta de ambição mas sim com a realidade.
R - É costume dizer-se que no futebol está tudo inventado mas a verdade é que cada treinador tem a sua marca, tem o seu estilo de futebol e o Ulisses Morais é conhecido também por ser um treinador que coloca as equipas a jogar à sua maneira. Como é jogar à Ulisses Morais?
UM - Há um conjunto de princípios que todos defendemos. Eu defendo os meus, defendo que jogar futebol implica um conjunto de ações que devem traduzir espetáculo. O que só é possível com um conjunto de atitudes. É através da atitude e do comportamento, através da qualidade, que se determina um padrão de jogo. Uma equipa sem atitude, pensando que a qualidade resolve todos os problemas, não é, garanto, uma equipa à Ulisses Morais. Uma equipa à Ulisses Morais é uma equipa que quer o espetáculo mas que tem, acima de tudo, os seus princípios de jogo nos diversos momentos do mesmo, com uma clara noção do que faz em campo e na sua organização.
R - É um treinador que privilegia aquilo a que podemos chamar ação psicológica?
UM - Sendo eu um homem da prática de futebol, não tendo sido um jogador de primeiríssimo nível, procurei sempre aprender com os que estavam ao meu lado. Percebi claramente desde muito cedo, desde os 28 anos, quando tirei o curso de treinador de 1.º nível, que só a minha prática não iria chegar para um dia mais tarde ser treinador. As ações de formação que faço com frequência, em Portugal e no estrangeiro, também me deram essa noção exata: para conduzir uma equipa de futebol não basta a nossa experiência, sendo fundamental retirar do grupo de trabalho tudo o que, em termos psicológicos, podemos retirar no momento, com a consciência sempre de que o jogo é uma ação muito violenta em termos mentais e psicológicos. Quem não estiver preparado para o sofrimento e para o prazer não conseguirá responder bem.
R - Disse-nos antes do início desta entrevista que nasceu em Santarém mas cresceu em Lisboa, no bairro da Graça, e que se sente um nortenho de alma e coração. Porquê?
UM - Fui criado numa família muito modesta e humilde, que vivia do seu trabalho. Tinha os meus amigos na rua, onde jogava bastante futebol, mas não tinha mais do que isso. Aos 18 anos, tive a felicidade de ser emprestado pelo Benfica ao Sporting da Covilhã e fui viver a norte, para o interior e comecei a perceber o que era as famílias e os amigos. Comecei a perceber que tudo o que ali via não tinha. Por isso digo que gostava de ser do Norte.
R - Há bem pouco tempo, o presidente do Sporting comparou o povo do Norte aos visigodos e ao seu sentido gregário com os mouros a Sul do Tejo. Há mesmo uma diferença notória entre estes "dois" países?
UM - Queria falar acima de tudo da minha experiência. E o que ela me diz é que viver a Norte e com as pessoas do Norte tem muito a ver com aquilo que eu defendo: frontalidade, honestidade, princípios, pureza das amizades. Encontrei isto tudo a norte, no interior, na Covilhã, que é onde tenho a minha residência oficial, onde está toda a minha família, onde nasceu o meu filho, onde tenho um casamento de 30 anos e onde me sinto muito feliz. Cuando quero recuperar as energias, passo lá uns dias e rejuvenesço.
R - O Paços também é um clube diferente porque paga e a horas, notando-se que tem uma relação de amizade com o presidente?...
UM - Tenho tido a felicidade de ter mantido boas relações com todos e de nenhum dirigente ter saltado comigo a trincheira. Talvez porque marco um território de forma natural.
R - Nunca um presidente lhe pediu para jogar o jogador x ou y?
UM - Tenho tido essa felicidade. Provavelmente nunca nenhum arriscou. Tenho a certeza que as pessoas quando arriscam é porque têm a certeza que o podem fazer. É muito fácil lidar comigo mas não será muito fácil entrar em alguns campos.
R - Permite que um presidente entre no balneário?
UM - Porque não? Então o presidente, que é uma peça importantíssima, não pode estar no balneário?! Era o que faltava! Ele tem que saber o que se passa lá dentro, ele tem saber até a estratégia para o jogo. Defendo que as pessoas com responsabilidade devem estar bem por dentro de tudo o que é a realidade.
R - Parece que hoje os treinadores portugueses são muito bons para os grandes...
UM - Já alguns anos que se reconhece a capacidade dos treinadores portugueses, técnicos que têm grande conhecimento do jogo e também da sua componente psicológica. Tenho a certeza que esse é o caminho. Embora muitas vezes as pessoas escolham por uma questão de moda.
R - Jorge Jesus chegou a um clube grande só depois de fazer muito caminho. Muitos dos seus colegas acham-no um treinador pouco simpático. Tem essa imagem também?
UM - Não posso falar pelos outros. Também optei por uma carreira discreta e não tenho um grupo de amigos especiais. Quando entendo que algo não está bem, também me insurjo, mas procuro fazê-lo em privado. Tenho a convicção de que nós, treinadores, devemos defender a nossa imagem e lutar por uma maior união na defesa do que é a nossa classe e o nosso posto de trabalho. Só assim seremos respeitados. Quanto ao Jorge, quem sou eu para falar naquilo que outros possam ter para dizer? O que posso afirmar sobre a sua simpatia, direi provavelmente aquilo que dizem de mim. Eu nada invisto na imagem - outros o fazem e por isso são mais apelativos... - mas não deixo de ser quem sou e vão ter de gostar de mim pelo meu trabalho e não pela minha imagem. O Jorge tem a preocupação de passar sobretudo a mensagem daquilo que é o seu trabalho sem se preocupar muito com aquilo que é a sua imagem.
R - Qual é o limite da sua ambição como treinador? É chegar ao patamar onde se encontra hoje Jorge Jesus?
UM - Seria imodesto se não dissesse que sim. Mas não é a minha principal preocupação. Quero continuar a viver de bem comigo, continuar a investir na minha formação, para que possa formar melhor os jogadores e ter melhores resultados. Com o objetivo de fazer com que quem trabalhe comigo sinta que está a trabalhar com uma pessoa diferente. Quem não trabalha comigo pode formar uma ideia errada de mim e quero ter a oportunidade de um dia poder lá chegar. Mas se não chegar quero deixar todos os dias uma imagem daquilo que eu sou, sem atropelos.
R - Quem está a ser o melhor jogador do campeonato?
UM - Não é fácil. Encontro um jogador que me está a surpreender muito pela sua dinâmica, pelos seus movimentos, pela sua capacidade de leitura do jogo: o Javi García. É um jogador nuclear. É um treinador em campo!
R - Surpreende-o a carreira do Sp. Braga. É mesmo um sério candidato ao título?
UM - Dizer que me surpreende não vou dizer. O Sp. Braga já é um clube com alguma grandeza. Tem um conjunto de jogadores que também têm grandeza para poderem formar um grupo que possa ombrear com os melhores. Para além do valor da equipa técnica. Por isso, não me parece que possa ser uma surpresa. Para os mais atentos pode parecer, para mim não...
R - E é surpresa para si o lugar que o Sporting ocupa na classificação?
UM - Isso é mais um pouco, tendo em conta um conjunto de fatores: a dimensão do clube, a grandeza da equipa técnica que trabalhou durante este tempo todo. Se o Sporting tivesse mais 7 ou 8 pontos já não seria uma surpresa e a verdade é que esses pontos podiam ter sido somados... Estas coisas não nos acontecem só a nós, desta vez aconteceu a um treinador de um clube grande. No futebol não nos podemos deixar surpreender facilmente porque já não é uma caixinha de surpresas como foi durante muito tempo.
R - Com um terço de campeonato decorrido, o Sporting está afastado da corrida pelo título?
UM - Não. O futebol, não sendo uma caixa de surpresas assim tão grande, reserva-nos sempre outras... surpresas. É um atraso significativo mas não há impossíveis.
R - Se vencer o Benfica, o Sporting pode salvar a face?
UM - Será um passo importante, sobretudo para os adeptos, que tanto empurram muito como puxam para baixo. Uma vitória eleva e potencia uma equipa num jogo deste tipo.
R - Como adjetiva este Benfica renascido?
UM - Uma equipa muito forte e invulgar, composta por gente que não sendo invulgar consegue dar uma dimensão maior ao Benfica. O clube procurou muita coisa, nomes, e aparentemente com gente "vulgar", que estava aqui ao pé, encontrou-se essa solução. O Benfica era grande mas não tinha grandeza. Que hoje tem. Falo de uma equipa técnica que, com 70% dos jogadores do anterior plantel, conseguiu transformar a equipa, estando os resultados à vista de toda a gente. Este é um Benfica a dar um grande exemplo do que é a grande capacidade dos portugueses, quer dos jogadores, quer dos treinadores, que na minha opinião têm feito um excelente trabalho.
R - Está de certo modo surpreendido com esta intermitência do FC Porto?
UM - Não. Estar a falar daquilo que não conheço tão bem é delicado. O que sei é que o FC Porto, num passado recente, com a mesma equipa técnica, com outros jogadores, é verdade, e alguns com grande importância, também teve problemas. Na última época, na 5.ª ou 6.ª jornada, o FC Porto estava com alguns problemas de identidade e de resultados. Estava numa aparente crise e a equipa técnica e o clube souberam resolver os problemas, dando a volta. É verdade que este ano faz alguma mossa o trabalho que o Benfica está a desenvolver, o que precipita um pouco e agita as pessoas, que receiam que o FC Porto possa ficar para trás.
RECORD - Começou a época na Naval 1.º de Maio mas agora está no Paços de Ferreira, curiosamente duas equipas neste momento com o mesmo número de pontos (10). Não está há muito tempo na capital do móvel mas já nos pode dar uma primeira impressão sobre esta nova experiência?
ULISSES MORAIS - Não teria assumido esta responsabilidade se não sentisse que ia sentir-me bem e que existiam condições para acreditarmos cada vez mais. Sinto que estou numa casa que tem muito a ver comigo. Estou consciente que nos dias que correm é algo que me parece raro. Acredito que as coisas vão continuar assim porque nada há em contrário em relação a um cenário diferente. Estou muito feliz por estar em Paços de Ferreira, onde me sinto em casa.
R - Já disse que o Paços de Ferreira é um clube à sua medida. Quer esmiuçar esta declaração?
UM - Quando estamos de fora, olhamos para o clube e percebemos que a casa pode não ter a melhor aparência. E nesse aspeto o Paços era um clube que já merecia melhor, ou seja, um estádio com outras condições. Por outro lado, quando defrontávamos o Paços o que sentíamos era que esta casa tinha alma. Porque para existir emoção e espetáculo há outras coisas essenciais que este Paços tem. Quando cheguei a esta casa, senti algo que tem a ver com a dimensão daquilo que eu entendo que é um clube com gente que vive o jogo e que tem gente que vive o seu clube com alma e paixão e que transmite isso a quem chega. O Paços é um dos clubes que ainda não perdeu a mística - provavelmente já não será a mesma de outros tempos - e que tem todas as condições para manter este espírito. E se alguma coisa se perdeu tem de se recuperar rapidamente, para que cada vez mais o Paços de Ferreira seja um clube com a identidade que é a sua imagem de marca..
R - Entende que as infraestruturas devem ser melhoradas?
UM - Todos os que trabalham naquela casa gostariam de ter, provavelmente, outro tipo de condições mesmo para poderem receber melhor não apenas os seus adeptos. Atualmente tudo se faz para que existam boas condições mas não é possível esticar mais.
R - Mas esse é um assunto falado no dia-a-dia?
UM - Desde a primeira hora registei a frontalidade com que me foi apresentado o projeto Paços de Ferreira, mostrando-me as virtudes, que são bastantes, e algumas das condicionantes, que também são algumas. Souberam dizer que gostariam de ter outro tipo de condições e que o clube está a crescer nesse sentido.
R - O que é que lhe foi pedido esta época?
UM - Os dirigentes tiveram o cuidado de nada me pedir e quando isto acontece é pedirem tudo. Tiveram a inteligência suficiente para me dizerem que o grande objetivo do Paços de Ferreira é permanecer neste patamar. Esse é o mínimo de ambição de qualquer equipa desta dimensão.
R - Mas lutar apenas pela permanência não será em vez de ambição falta dela?
UM - Na minha opinião é uma grande realidade. Agora, se a permanência for atingida com um patamar de menor sofrimento, parece-me que essa será uma ambição nivelada por cima. É isso que temos de perceber. Se queremos na próxima época estar neste escalão com sofrimento até à última jornada, ou com capacidade para que isso não aconteça. O Paços de Ferreira deseja, naturalmente, ver-se livre de qualquer situação incómoda, não deixando a equipa exposta no último terço do campeonato, quando tentam lutar por todos os meios e por todas as formas para se salvar. Essa é, naturalmente, uma situação que me parece muito normal e que nada tem a ver com a falta de ambição mas sim com a realidade.
R - É costume dizer-se que no futebol está tudo inventado mas a verdade é que cada treinador tem a sua marca, tem o seu estilo de futebol e o Ulisses Morais é conhecido também por ser um treinador que coloca as equipas a jogar à sua maneira. Como é jogar à Ulisses Morais?
UM - Há um conjunto de princípios que todos defendemos. Eu defendo os meus, defendo que jogar futebol implica um conjunto de ações que devem traduzir espetáculo. O que só é possível com um conjunto de atitudes. É através da atitude e do comportamento, através da qualidade, que se determina um padrão de jogo. Uma equipa sem atitude, pensando que a qualidade resolve todos os problemas, não é, garanto, uma equipa à Ulisses Morais. Uma equipa à Ulisses Morais é uma equipa que quer o espetáculo mas que tem, acima de tudo, os seus princípios de jogo nos diversos momentos do mesmo, com uma clara noção do que faz em campo e na sua organização.
R - É um treinador que privilegia aquilo a que podemos chamar ação psicológica?
UM - Sendo eu um homem da prática de futebol, não tendo sido um jogador de primeiríssimo nível, procurei sempre aprender com os que estavam ao meu lado. Percebi claramente desde muito cedo, desde os 28 anos, quando tirei o curso de treinador de 1.º nível, que só a minha prática não iria chegar para um dia mais tarde ser treinador. As ações de formação que faço com frequência, em Portugal e no estrangeiro, também me deram essa noção exata: para conduzir uma equipa de futebol não basta a nossa experiência, sendo fundamental retirar do grupo de trabalho tudo o que, em termos psicológicos, podemos retirar no momento, com a consciência sempre de que o jogo é uma ação muito violenta em termos mentais e psicológicos. Quem não estiver preparado para o sofrimento e para o prazer não conseguirá responder bem.
R - Disse-nos antes do início desta entrevista que nasceu em Santarém mas cresceu em Lisboa, no bairro da Graça, e que se sente um nortenho de alma e coração. Porquê?
UM - Fui criado numa família muito modesta e humilde, que vivia do seu trabalho. Tinha os meus amigos na rua, onde jogava bastante futebol, mas não tinha mais do que isso. Aos 18 anos, tive a felicidade de ser emprestado pelo Benfica ao Sporting da Covilhã e fui viver a norte, para o interior e comecei a perceber o que era as famílias e os amigos. Comecei a perceber que tudo o que ali via não tinha. Por isso digo que gostava de ser do Norte.
R - Há bem pouco tempo, o presidente do Sporting comparou o povo do Norte aos visigodos e ao seu sentido gregário com os mouros a Sul do Tejo. Há mesmo uma diferença notória entre estes "dois" países?
UM - Queria falar acima de tudo da minha experiência. E o que ela me diz é que viver a Norte e com as pessoas do Norte tem muito a ver com aquilo que eu defendo: frontalidade, honestidade, princípios, pureza das amizades. Encontrei isto tudo a norte, no interior, na Covilhã, que é onde tenho a minha residência oficial, onde está toda a minha família, onde nasceu o meu filho, onde tenho um casamento de 30 anos e onde me sinto muito feliz. Cuando quero recuperar as energias, passo lá uns dias e rejuvenesço.
R - O Paços também é um clube diferente porque paga e a horas, notando-se que tem uma relação de amizade com o presidente?...
UM - Tenho tido a felicidade de ter mantido boas relações com todos e de nenhum dirigente ter saltado comigo a trincheira. Talvez porque marco um território de forma natural.
R - Nunca um presidente lhe pediu para jogar o jogador x ou y?
UM - Tenho tido essa felicidade. Provavelmente nunca nenhum arriscou. Tenho a certeza que as pessoas quando arriscam é porque têm a certeza que o podem fazer. É muito fácil lidar comigo mas não será muito fácil entrar em alguns campos.
R - Permite que um presidente entre no balneário?
UM - Porque não? Então o presidente, que é uma peça importantíssima, não pode estar no balneário?! Era o que faltava! Ele tem que saber o que se passa lá dentro, ele tem saber até a estratégia para o jogo. Defendo que as pessoas com responsabilidade devem estar bem por dentro de tudo o que é a realidade.
R - Parece que hoje os treinadores portugueses são muito bons para os grandes...
UM - Já alguns anos que se reconhece a capacidade dos treinadores portugueses, técnicos que têm grande conhecimento do jogo e também da sua componente psicológica. Tenho a certeza que esse é o caminho. Embora muitas vezes as pessoas escolham por uma questão de moda.
R - Jorge Jesus chegou a um clube grande só depois de fazer muito caminho. Muitos dos seus colegas acham-no um treinador pouco simpático. Tem essa imagem também?
UM - Não posso falar pelos outros. Também optei por uma carreira discreta e não tenho um grupo de amigos especiais. Quando entendo que algo não está bem, também me insurjo, mas procuro fazê-lo em privado. Tenho a convicção de que nós, treinadores, devemos defender a nossa imagem e lutar por uma maior união na defesa do que é a nossa classe e o nosso posto de trabalho. Só assim seremos respeitados. Quanto ao Jorge, quem sou eu para falar naquilo que outros possam ter para dizer? O que posso afirmar sobre a sua simpatia, direi provavelmente aquilo que dizem de mim. Eu nada invisto na imagem - outros o fazem e por isso são mais apelativos... - mas não deixo de ser quem sou e vão ter de gostar de mim pelo meu trabalho e não pela minha imagem. O Jorge tem a preocupação de passar sobretudo a mensagem daquilo que é o seu trabalho sem se preocupar muito com aquilo que é a sua imagem.
R - Qual é o limite da sua ambição como treinador? É chegar ao patamar onde se encontra hoje Jorge Jesus?
UM - Seria imodesto se não dissesse que sim. Mas não é a minha principal preocupação. Quero continuar a viver de bem comigo, continuar a investir na minha formação, para que possa formar melhor os jogadores e ter melhores resultados. Com o objetivo de fazer com que quem trabalhe comigo sinta que está a trabalhar com uma pessoa diferente. Quem não trabalha comigo pode formar uma ideia errada de mim e quero ter a oportunidade de um dia poder lá chegar. Mas se não chegar quero deixar todos os dias uma imagem daquilo que eu sou, sem atropelos.
R - Quem está a ser o melhor jogador do campeonato?
UM - Não é fácil. Encontro um jogador que me está a surpreender muito pela sua dinâmica, pelos seus movimentos, pela sua capacidade de leitura do jogo: o Javi García. É um jogador nuclear. É um treinador em campo!
R - Surpreende-o a carreira do Sp. Braga. É mesmo um sério candidato ao título?
UM - Dizer que me surpreende não vou dizer. O Sp. Braga já é um clube com alguma grandeza. Tem um conjunto de jogadores que também têm grandeza para poderem formar um grupo que possa ombrear com os melhores. Para além do valor da equipa técnica. Por isso, não me parece que possa ser uma surpresa. Para os mais atentos pode parecer, para mim não...
R - E é surpresa para si o lugar que o Sporting ocupa na classificação?
UM - Isso é mais um pouco, tendo em conta um conjunto de fatores: a dimensão do clube, a grandeza da equipa técnica que trabalhou durante este tempo todo. Se o Sporting tivesse mais 7 ou 8 pontos já não seria uma surpresa e a verdade é que esses pontos podiam ter sido somados... Estas coisas não nos acontecem só a nós, desta vez aconteceu a um treinador de um clube grande. No futebol não nos podemos deixar surpreender facilmente porque já não é uma caixinha de surpresas como foi durante muito tempo.
R - Com um terço de campeonato decorrido, o Sporting está afastado da corrida pelo título?
UM - Não. O futebol, não sendo uma caixa de surpresas assim tão grande, reserva-nos sempre outras... surpresas. É um atraso significativo mas não há impossíveis.
R - Se vencer o Benfica, o Sporting pode salvar a face?
UM - Será um passo importante, sobretudo para os adeptos, que tanto empurram muito como puxam para baixo. Uma vitória eleva e potencia uma equipa num jogo deste tipo.
R - Como adjetiva este Benfica renascido?
UM - Uma equipa muito forte e invulgar, composta por gente que não sendo invulgar consegue dar uma dimensão maior ao Benfica. O clube procurou muita coisa, nomes, e aparentemente com gente "vulgar", que estava aqui ao pé, encontrou-se essa solução. O Benfica era grande mas não tinha grandeza. Que hoje tem. Falo de uma equipa técnica que, com 70% dos jogadores do anterior plantel, conseguiu transformar a equipa, estando os resultados à vista de toda a gente. Este é um Benfica a dar um grande exemplo do que é a grande capacidade dos portugueses, quer dos jogadores, quer dos treinadores, que na minha opinião têm feito um excelente trabalho.
R - Está de certo modo surpreendido com esta intermitência do FC Porto?
UM - Não. Estar a falar daquilo que não conheço tão bem é delicado. O que sei é que o FC Porto, num passado recente, com a mesma equipa técnica, com outros jogadores, é verdade, e alguns com grande importância, também teve problemas. Na última época, na 5.ª ou 6.ª jornada, o FC Porto estava com alguns problemas de identidade e de resultados. Estava numa aparente crise e a equipa técnica e o clube souberam resolver os problemas, dando a volta. É verdade que este ano faz alguma mossa o trabalho que o Benfica está a desenvolver, o que precipita um pouco e agita as pessoas, que receiam que o FC Porto possa ficar para trás.
2 comentários:
Agrada-me bastante este treinador. Gosto do discurso dele e os resultados começam a aparecer. Ta visto que a derrota com o Leiria foi apenas um lapso.
Força Ulisses. Que o nosso sucesso seja o teu sucesso
Tambem vejo com bons olhos este mister espero em breve ver resultados .
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